LEGISLAÇÃO

OPINIÃO: O direito do titular de alvará de pesquisa à indenização pela exploração mineral irregular pelo superficiário

Um julgamento emblemático concluiu entendeu que o particular que detém a portaria de pesquisa tem...

Este artigo tem 10 anos. As imagens podem não ser exibidas.

Os recursos minerais são, nos termos do artigo 20, IX, da Constituição Federal, bens de propriedade da União, a qual, face à inviabilidade de explorá-los diretamente, autoriza os particulares a realizar a atividade minerária, não obstante a propriedade do solo onde se localizam as jazidas (superficiários).

Nesse sentido, como se sabe, são diversos os regimes de aproveitamento das substâncias minerais previstos no Código de Mineração – a saber: regime de concessão, regime de autorização, regime de licenciamento, regime de permissão de lavra garimpeira, regime de monopolização –, sendo a autorização de pesquisa o regime de aproveitamento mineral cuja finalidade é a viabilização dos trabalhos voltados à definição da jazida, à sua avaliação e à determinação da exequibilidade de seu aproveitamento econômico.

O título autorizativo que outorga ao particular o direito de realização de pesquisa sobre a jazida é o “alvará de pesquisa”, outorgado pelo diretor-geral do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Sobre o título autorizativo em comento, muito se questiona acerca dos direitos (ou sua expectativa) advindos de sua obtenção.

Em emblemático julgamento sobre o tema, o do Recurso Especial 1471571, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o particular que detém o alvará de pesquisa sobre jazida de minérios tem direito à indenização por danos materiais decorrentes da exploração irregular por terceiros.

No caso concreto, o particular obteve em 2002 direito à pesquisa de estanho por seis anos em área localizada no município de Ariquemes (RO). Em 2006, o superficiário extraiu ilegalmente toneladas de minério. Assim, o titular do alvará de pesquisa ajuizou ação reparatória com a pretensão de se ver ressarcido pelos prejuízos suportados em razão da extração irregular.

Após o trâmite em 1ª e 2 ª instâncias, o entendimento prevalente, do STJ, foi o de que a exploração irregular acarreta prejuízo ao detentor do alvará de pesquisa, de forma que deve haver o ressarcimento, na forma da lei.

Na ocasião, consignou-se que embora a Constituição Federal de 1988 tenha atribuído a propriedade das reservas minerais à União, seguindo uma tendência global ante o manifesto reconhecimento da existência de interesse nacional, o Constituinte, reconhecendo igualmente a importância econômica dos minérios na atividade privada, optou por resguardar a possibilidade de exploração de jazidas por particulares, desde que brasileiros.

Por essas razões, concluiu o STJ que uma vez autorizada a pesquisa para fins de mineração, nasce para o autorizatário o direito subjetivo e exclusivo à futura exploração da mina, como decorrência do direito de prioridade previsto no art. 11 do Código de Mineração, não obstante a propriedade pela União.

Disso decorre uma série de desdobramentos a serem observados em casos análogos. Por primeiro, por esbarrar a decisão na discussão relativamente aos direitos decorrentes do alvará de pesquisa: se efetivos, no que concerne à futura exploração da lavra, ou se mera expectativa.

Os que argumentam tratar-se o título em comento de mera expectativa de direito à lavra, aduzem que o alvará de pesquisa não assegura legalmente ao seu titular direitos econômico-financeiros sobre a jazida. Aos que advogam nesse sentido, seria expectativa, assim, exatamente porque se trata de atividade geologicamente aleatória e, deste modo, garantias não há de que, não obstante a titularidade de alvará para empreender pesquisa, o minerador lograria efetivamente, em algum momento posterior, a lavra das jazidas.

Entretanto, à margem da controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre o tema, há que se pensar nas implicações práticas da posição adotada pelo STJ. A primeira, que a nós afigura-se positivamente relevante, trata-se da manutenção do valor econômico do título minerário. Explica-se.

Como é cediço, o potencial econômico das jazidas afere-se mediante prognóstico realizado por ocasião da prospecção. Destarte, é evidente que um dos principais componentes de valoração do título minerário detido pelo titular corresponderá à reserva mineral da jazida objeto do título. Como consequência, é evidente que a exploração irregular por terceiros (no caso em comento, o superficiário) interfere diretamente na esfera patrimonial do titular, na medida em que reduz o potencial econômico da jazida e, inclusive, implicará manifesta depreciação do valor de mercado do título.

Nesse ponto, parece-nos acertada a decisão sob exame, na medida em que, consoante os ditames legais pertinentes e, sobretudo, em harmonia com o instituto da responsabilidade civil, possibilita o ressarcimento dos prejuízos causados à esfera patrimonial do titular pela depreciação do título minerário em razão da exploração irregular empreendida no local.

Noutro giro, a decisão possivelmente suscitará controvérsias quanto a outros aspectos. Basta que se pense, a título de exemplo, na invocação da hipótese análoga de criação e implementação de Unidades de Conservação (UCs) do grupo de proteção integral em áreas que sejam já objeto de alvará de pesquisa, ou mesmo outro título autorizativo. Como se sabe, a criação das UCs é uma das medidas que, quando impostas a particulares, potencialmente inviabilizarão o seu direito de exploração do potencial econômico da propriedade e, assim, criam barreiras a empreendimentos de grande porte (a propósito, ver nosso artigo “A Criação de Unidades de Conservação como Medida Restritiva”).

O entendimento também se aplicaria, por evidente, às UCs que, embora dotadas de natureza de uso sustentável, equiparam-se às de proteção integral, como, por exemplo, as Reservas Extrativistas e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs)

Ora, considerando-se a posição recentemente adotada pelo STJ no julgado em comento, deverá o entendimento ser ampliado, também, em benefício da coerência jurisdicional, às hipóteses correlatas, havendo necessidade, assim, de se indenizar o particular detentor de alvará de pesquisa pela criação de certas Unidades de Conservação no local objeto do título de pesquisa, quando a pesquisa e futura exploração da jazida restar prejudicada pela criação da UC.

Como se vê, o entendimento assentado pelo STJ é digno de cumprimentos, posto possibilitar maior segurança jurídica ao titular de alvará de pesquisa, na medida em que assegura a manutenção do valor econômico de seu título.

Entretanto, restará saber se doravante a Administração Pública agirá em harmonia com o julgado, transpondo a sua aplicação também às demais hipóteses em que o entendimento revele-se também adequado, tais como as quais se alude no presente ensaio.

Alexandre Sion, Maria Carolina Faria Dutra e Caio de Pádua são advogados do escritório Sion Advogados (www.sionadvogados.com.br), especializado em empreendimentos que possuem obras de infraestrutura, como mineração, óleo & gás e construção civil.